Já era quase meia-noite quando Vinícius, aquele que considerava um dos seus poucos amigos em Brasília, chegou e foi logo pedindo uma dose dupla de Cutty Sark. Vinícius é uma cara pacato e trabalhava na redação do Correio. Nasceu no Rio, mas estava em Brasília há mais tempo do que era capaz de lembrar. Estava, apesar da pouca idade, sendo cotado para o cago de Redator-Chefe do periódico. Andava nervoso, confuso e cansado da rotina jornalística, mas não podia perder a oportunidade. Trabalhava quase 16 horas por dia e sua resistência estava no limite.
“Vai com calma”, afirmou ele.
“Como vai amigo?”
“Eu que pergunto como vai você? Descobriu que você é adotado e foi molestado pelo caseiro quando pequeno?”
“Engraçado como você acha que consegue ser cômico”, disse e, em seguida, tomou de vez a dose dupla do scotch.
“Diga o que aconteceu, Seinfeld.”
“Fui conversar o tio Ruy sobre meus planos de casar ainda esse ano, que a Andrea estava ameaçando me deixar caso não entrasse no altar até o dia 31 de dezembro..”
Tio Ruy é uns 15 anos mais velho que Vinícius e uma espécie de guru para assuntos que não importavam muito: relacionamentos e vida profissional.. Ruy foi criado pelo pai de Vinícius e tornou-se uma espécie de irmão mais velho.
“O que ele disse?”
“Eu perguntei a ele o que ele achava, e sabe o que ele me respondeu?”
“O que?”
“Tanto faz....”
“Que tipo de conselho é esse?”
“Disse que tanto faz, que eu vou me arrepender de qualquer jeito. Casando ou não, eu vou me arrepender. Se casar agora vou me arrepender e se perder a Andrea também vou...”
“Porra. Tenho que admitir, o cara sabe das coisas”.
“É. O filho da puta está certo. É foda quando as coisas parecem não ter jeito, mesmo quando as opções são muitas. Lembra daqueles livrinhos que vendiam no final da década de 80 que você podia escolher que direção tomar entre algumas opções que o livro oferecia? Não importa qual o caminho tomado, às vezes, você se fudia por causa de uma decisão tomada antes Odiava aquela porra, mas li todos. Sempre dava um jeito de me dar bem, mas na vida é diferente. Não posso voltar atrás e pegar um outro caminho para me dar bem na frente. O livrinho que conta a história de minha vida só tem opções nas quais eu me fodo”
“Nossa. Vai escrever uma novela mexicana sobre sua vida? Esquece. Vamos beber. Sabe aquela maluca que é amiga da Vivi? Aquela que está louca para me dar?”
Vinícius acenou positivamente com a cabeça.
“Tá aí.”
“Coma.”
“Não quero. Ela vai grudar. Eu tenho certeza. Não quero ter que ser grosso com ela. Sei que no dia seguinte foi expulsá-la de minha casa. Tenho isso. No outro dia não vou querer olhar para a cara dela.”
“Você é viado...”
“Engraçado como você acha que consegue ser cômico”, retrucou ele.